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abr. 2021

Órfãos da terra: conheça a brasileira que capacita refugiadas iraquianas para criarem acessórios que são usados na novela das seis

RIO – Em um pequeno ateliê dentro de uma galeria comercial do Jardim Botânico, na Zona Sul do Rio, Rosane Lopes reúne colares, pulseiras, lenços e anéis, entre outras peças, de diversas partes do mundo. Os acessórios, criados por ela e por outras mulheres contam histórias: alguns foram produzidos na Baixada Fluminense e outros, no Iraque. Um princípio une fios, contas e cristais: capacitação e geração de renda devem andar juntas no caminho para o empoderamento feminino.

Foi durante uma experiência de quase dois anos em um campo de refugiados, em Dahuk, no norte do Iraque, que a designer começou o projeto-piloto da oficina de capacitação. No local, vivem milhares de famílias yazidis, uma minoria curda, nem muçulmana nem cristã, perseguida pelo Estado Islâmico por anos. As peças produzidas nesta primeira experiência, com dez mulheres, foram usadas na novela “Órfãos da terra”, da TV Globo.

– Era um trabalho de três meses, mas eu acabei ficando quase dois anos. É uma região de muita carga histórica e é o lugar dessas mulheres. Elas não querem sair dali, mas são obrigadas pela falta de dinheiro. Então eu propus fazer esse projeto de capacitação e geração de renda para elas — explica Rosane, que faz reuniões por Skype com o grupo enquanto está no Brasil, e formalizou o projeto em conjunto com as integrantes.

Com formação nas áreas de Sociologia e Antropologia, Rosane trabalhou em diferentes agências das Nações Unidas, como o Unicef e a Organização Mundial da Saúde, desenvolvendo campanhas de comunicação em países que passavam por situações de crise, como epidemias, até deixar a ONU e criar sua própria empresa: o Instituto Discipline for Dignity (D4D). A fundação atua em diferentes eixos, como projetos na área da educação e preservação da água, por exemplo. Atualmente, o foco está na capacitação de mulheres através do artesanato. Para ela, o empoderamento da mulher só acontece de fato com independência financeira e geração de renda.

– Quando você trabalha com empoderamento feminino, precisa trabalhar com discurso para que a mulher entenda quais são os seus direitos. Mas ela também tem que ter condições de gerar renda porque uma mulher com renda melhor investe numa educação melhor para os filhos, investe na própria família. A mulher empoderada e com renda é catalisadora de mudanças, criando um sistema crescente que empoderar o outro: o filho, a mãe, a tia, a amiga. Isso é muito grande, e é por aí que a gente deve começar as mudanças – defende.

Atividade começou na Baixada

Rosane fez seu primeiro trabalho com mulheres que estavam em abrigos na Baixada Fluminense. Foi em 2013, após fortes chuvas deixarem mortos e famílias desalojadas na região de Xerém, em Duque de Caxias. Com cápsulas de café, as 20 integrantes do grupo confeccionavam colares e outras biojoias que eram vendidas em diferentes locais. Ela defende que as oficinas de capacitação não se resumem ao aprendizado de uma técnica, mas ao entendimento de como o mercado funciona.

– Com o grupo da Baixada, às vezes nós íamos ao shopping e eu dizia para elas que tudo que nós produzíamos, buscávamos vender ali e que tínhamos que trabalhar sempre para que o produto tivesse qualidade e fosse vendido. A mulher tem que descobrir qual é o potencial que ela tem e o que ela quer fazer. Então nós vamos buscar o seu mercado, como uma empresa – afirma Rosane, lembrando que ainda hoje algumas das mulheres do grupo seguem produzindo peças.

Do Iraque para “Órfãos da terra”

Após 14 meses de trabalho humanitário no Iraque, Rosane trouxe um rico material fotográfico produzido por lá e montou um grupo de trabalho para que as imagens fossem expostas na mesma galeria no Jardim Botânico onde fica seu ateliê, o BZZ.

– Queria muito fazer a exposição para mostrar que tem uma organização nos campos de refugiados, que as pessoas estão momentaneamente assim e como é a vida deles por lá – explica.

No grupo, havia uma amiga em comum de uma figurinista da novela “Órfãos da Terra”. Rosane acabou prestando uma espécie de “consultoria informal” e acessórios produzidos na oficina-piloto foram usados por personagens como Laila (Julia Dalavia), Rania (Eliane Giardini) e Soraia (Leticia Sabatella).

Rosane volta ao Iraque este mês para a primeira oficina do projeto “Arte de Transformar – Refazendo Vidas”, agora oficial. Na região, são seis acampamentos, cada um com 3 mil famílias. As peças produzidas na turma, inicialmente com 25 mulheres, serão vendidas no ateliê BZZ, na França e na internet.

– Eu sinto que tenho uma responsabilidade. Acredito que o mundo conspira com você, e você conspira com o mundo. E preciso dar o retorno de tudo que eu tive. O meu desejo é que o projeto se torne uma cooperativa, gerida por essas mulheres, estou trabalhando com elas essa ideia – finaliza.